Portugal tem mais depressões e doenças mentais que os
vizinhos latinos
02/03/2012 -
08:34
Portugal tem
maior prevalência de doenças mentais e depressões graves do que os países
vizinhos latinos, disse esta sexta-feira à agência Lusa o psiquiatra Álvaro de
Carvalho, citando dados preliminares do primeiro estudo internacional sobre o
tema.
Segundo o psiquiatra, que lidera o plano de prevenção de depressões e suicídios, integrado no Plano Nacional de Saúde Mental, o estudo mostra que Portugal é um dos países com maior número de depressões.
"Enquanto a Espanha e a França têm índices de prevalência de doença mental entre os 8 e os 9,2 por cento, nós temos cerca de 23 por cento", afirmou, acrescentando que "a prevalência de depressões em termos internacionais ronda os 4 por cento, mas em Portugal chega aos 7 por cento".
Para Álvaro de Carvalho, "isto mostra que existe um problema sério de depressão, que tem que ser estudado, até para se perceber como é que os índices são tão altos quando a toma de antidepressivos é tão elevada".
Por outro lado, adiantou o responsável, "a evidência científica aponta para uma tendência que não pode deixar de chamar a atenção da sociedade em geral e dos políticos em particular: dados internacionais mostram existir uma correlação directa entre o aumento da prevalência de doenças mentais e o grau de desigualdades em termos sociais".
De acordo com o coordenador deste plano nacional, Portugal tem um nível alto de desigualdades sociais, a par de países como os Estados Unidos ou a Nova Zelândia.
“Estes índices tão elevados medem situações como a gravidez na adolescência – em que somos campeões a par do Reino Unido –, problemas de álcool, de obesidade ou de mobilidade social e desemprego”, disse.
Um estudo da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre o "Impacto da crise económica na saúde mental" na Europa concluiu que, em geral, as recessões económicas em países com o grau de desenvolvimento de Portugal não têm impacto ou reduzem mesmo as taxas de mortalidade, nomeadamente por acidentes rodoviários, já que as pessoas usam menos os carros.
No entanto, a análise realizada na União Europeia mostrou que os problemas económicos nos países com menor riqueza aumentaram a mortalidade, sobretudo devido a suicídios e outras causas violentas e problemas de alcoolismo.
Prevenção nacional de depressões e suicídios começa no Verão
Uma comissão de psiquiatras, enfermeiros e académicos portugueses e estrangeiros vai passar a executar, a partir do final do Verão, um plano para prevenir os suicídios em Portugal, na sequência do aumento esperado de depressões devido à crise.
O objectivo faz parte do Plano Nacional de Saúde Mental 2007/2016, mas a sua concretização foi acelerada devido ao aumento esperado de depressões causadas pela crise.
A comissão será liderada por Álvaro de Carvalho, director do Programa Nacional da Saúde Mental, da Direcção Geral de Saúde, que explicou à agência Lusa que “a principal causa de suicídios é a depressão”, embora Portugal tenha registado, num eurobarómetro divulgado em 2010, “um consumo médio de antidepressivos cinco vezes superior à média europeia”.
Por isso e porque a crise económica levou a União Europeia e a Organização Mundial de Saúde a lançar alertas para a probabilidade de as depressões aumentarem, a prevenção passou a ser a palavra-chave, acrescentou Álvaro de Carvalho.
Um estudo da OMS/Europa, que visou perceber o impacto de crises anteriores na saúde mental, indica que “nos países de desenvolvimento médio e elevado como Portugal, as situações de suicídio têm aumentado por questões de ansiedade e depressão”, afirmou o especialista.
Por outro lado, os números de mortes por suicídio em Portugal não são fiáveis, considerou.
“Há muitas dúvidas sobre os números efectivos de suicídios em Portugal”, disse, explicando que “Portugal é um dos países da Europa com maior número de mortes por causas não identificadas, [mas] entre 2002 e 2004, a Direcção Geral de Saúde promoveu uma revisão de todas as certidões de óbito com causa não identificada e concluiu, como se esperava, que um grande número tinha a ver com suicídios”.
Esta situação, segundo o especialista, deve-se a aspectos sociológicos como a tradição religiosa que é a necessidade de accionar seguros de vida, que não abrangem as mortes por suicídio.
Embora as medidas ainda não estejam definidas – a própria comissão ainda está em processo de constituição –, Álvaro de Carvalho explica que as iniciativas de prevenção passam, nomeadamente, por sistematizar o diagnóstico e terapêutica da depressão, sobretudo a nível dos cuidados primários, e a articulação com as equipas de saúde mental e com outras entidades clínicas.
Da comissão fazem parte, entre outros, o coordenador português da Aliança Europeia contra a Depressão, Ricardo Gusmão, o psiquiatra Daniel Sampaio, o fundador da Sociedade Portuguesa de Suicidologia, Carlos Brás Saraiva, o presidente da mesma sociedade, José Carlos Santos, o director da delegação de Lisboa do Instituto de Medicina Legal, Jorge Costa Santos, além de Álvaro de Carvalho, como coordenador.
A comissão vai integrar ainda três académicos estrangeiros “que aceitaram fazer parte como consultores deste grupo”, disse o responsável.
A coordenação será feita também em colaboração com os directores dos 10 agrupamentos de Centros de Saúde onde o suicídio tem maior expressão, 10 coordenadores das unidades de saúde familiares piloto com elevada expressão de suicídios e os directores dos departamentos de saúde mental dos hospitais.
O grupo incluirá ainda representantes das ordens dos Médicos, dos Psicólogos e dos Enfermeiros, da Associação de Profissionais de Serviço Social, da Associação de Medicina Geral e Familiar, dos Médicos de Saúde Pública, dos telefones SOS, e envolverá ainda associações empresariais e sindicais, agentes da autoridade, bombeiros, câmaras municipais e outras entidades com capacidade de intervenção junto da população em maior crise, como por exemplo sacerdotes.
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