ONU faz questão de sublinhar que o número de pessoas com fome é ainda "inaceitavelmente alto", muito acima das metas definidas pelos Objectivos do Milénio Fawad Hussein, EPA
As estatísticas das Nações Unidas apontam para menos 77 milhões de pessoas com fome crónica em 2010, face aos números do ano passado. Em Roma, sede do organismo, o Fundo das Nações Unidas para a Agricultura (FAO) apresentou um relatório que dá conta de 925 milhões de pessoas a sofrerem de fome crónica por todo o Mundo, o primeiro corte em 15 anos nos números da fome, mas que o organismo não considera ser motivo de satisfação.
De acordo com o relatório apresentado pela FAO, na sua sede em Roma, a fome continua a ser sentida em particular na Ásia e na África (30 por cento só na África sub-sahariana). No entanto, beneficiando das boas colheitas e da queda no preço dos alimentos, foi assinalado esse primeiro corte em década e meia no número de subnutridos, para os 925 milhões de pessoas. Trata-se porém de uma cifra que a FAO não deixa de ver como "inaceitavelmente alto" e de maneira alguma razão para manifestações de triunfalismo.
"A cada seis segundos uma criança morre devido a problemas relacionados com a má nutrição. A fome continua a ser a maior tragédia e o maior escândalo no Mundo", advertiu o director-geral do FAO, Jacques Diouf.
A esta declaração juntou-se a directora-geral do Programa Alimentar Mundial: "Uma pessoa em cada seis levanta-se sem ter o que comer", lamentou Josette Sheeran.
De acordo com os números oficiais, havia em 2009 cerca de 1,02 mil milhões de pessoas afectadas pelo flagelo da fome, tendo caído a barreira psicológica dos mil milhões. Ainda assim, o organismo da ONU faz questão de sublinhar que a contabilidade aponta para um número "inaceitavelmente alto", muito acima das metas definidas pelo programa dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio.
A erradicação da pobreza extrema e da fome foi colocada no topo da lista de objectivos da Declaração do Milénio, documento adoptado no ano de 2000 pela totalidade dos 189 Estados-membros da Assembleia-Geral das Nações Unidas. A ideia inicial apontava para uma redução das pessoas com fome nos países em desenvolvimento dos 20 por cento de 1990-92 para 10 por cento em 2015.
É com esta meta em vista que o FAO sublinha que, apesar da redução de famintos crónicos em cerca de 77 milhões de pessoas, as populações mais carenciadas são fortemente afectadas por "um profundo problema estrutural que ameaça a capacidade de atingir acordos internacionais sobre os objectivos de redução da fome".
A manter-se a evolução actual dos números, em 2015 teremos 16 por cento de subnutridos nos países em desenvolvimento, muito longe dos 10 por cento estabelecidos. Os 10 por cento "antevêem-se muito difíceis de atingir", advertiu Jacques Diouf, para sublinhar que "é a hora de atacar as verdadeiras causas da fome no mundo, em particular com mais forte investimento na agricultura" e nos programas de ajuda social.
Passos mais importantes dados por China e Índia
Com um território desigualmente distribuído, a fome afecta predominantemente os continentes africano e asiático. Só na China e na Índia vivem mais de 40 por cento das pessoas subnutridas. Se alargarmos a faixa das pessoas com fome aos dois terços, juntam-se a estes país Bangladesh, Indonésia, Paquistão, República Democrática do Congo e Etiópia.
Entretanto, de acordo com o relatório hoje apresentado em Roma, o FAO sublinha que este corte no número de famintos é fundamentalmente fruto dos progressos dos gigantes China e Índia.
Uma mãozinha da natureza
O FAO aponta no seu relatório que há uma relação directa entre o decréscimo no número de pessoas com fome e o crescimento económico nos países em vias de desenvolvimento. Mas o documento não esquece a ajuda que veio da natureza e que permitiu que o preço dos cereais tenha caído após os picos de 2008, "reflectindo dois anos consecutivos de produções recorde".
O relatório estima ainda que em 2010, apesar de a produção estimada "ser mais baixa, a situação global é considerada adequada".
O FAO deverá voltar a reunir-se a 24 de Setembro, dentro de duas semanas, tendo em cima da mesa o aumento do preço dos alimentos e um problema que preocupa os seus peritos: a especulação.
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